Sofrimento fetal, o que é e o que fazer?

Sofrimento fetal é a condição onde o bebê recebe pouco oxigênio e nutrientes por insuficiência placentária ou hipoperfusão uterina.

Dr Rafael Bruns

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Feto de 20 semanas

Apesar do nome sofrimento fetal nos remeter a imaginar algo como o feto sentindo dor ou vivendo uma experiência emocionalmente aversiva, o termo sofrimento fetal não tem relação com isso. O quadro conhecido como sofrimento fetal refere-se a situações que podem ocorrer quando o fornecimento de nutrientes e oxigênio ao feto é insuficiente devido à má perfusão vascular materna e/ou extração ineficiente de oxigênio e nutrientes pela placenta.

O que pode causar sofrimento fetal para o feto?

Causas de falta de Oxigênio no Sofrimento Fetal

A falta de oxigênio para o feto pode ocorrer basicamente por dois problemas distintos. Eles podem ocorrer separadamente ou em conjunto. O primeiro problema que pode ocorrer é uma perfusão sanguínea inadequada para o útero. Quando a mulher não está grávida o fluxo sanguíneo para o seu útero é de cerca de 50ml/min. Já no fim da gestação o fluxo será de aproximadamente 500 ml/min, ou seja, 10 vezes maior.

O aumento de fluxo sanguíneo para o útero

Esse aumento no fluxo de sangue para o útero ocorre em função de um processo desencadeado pela placenta, chamado de invasão trofoblástica. Numa gestação normal, a artéria espiralada (aquela que fica na parte mais interna do útero) tem um diâmetro relativamente pequeno. Quando a placenta está se formando, algumas células dela chamadas de trofoblasto, invadem a parede do útero e “destroem” a camada muscular das artérias espiraladas. Isso faz com que o diâmetro dessas artérias aumente consideravelmente com a idade gestacional. Essa condição faz com que o fluxo de sangue para o útero aumente consideravelmente, permitindo o desenvolvimento adequado do bebê.

Invasão do Trofoblasto em Gestação Normal versus Pré-Eclâmpsia ou Restrição de crescimento.

Em casos onde a invasão do trofoblasto não ocorre de maneira adequada, a quantidade de sangue transportada para o útero da mãe é menor, sendo que essa alteração uma das causas de restrição de crescimento fetal e sofrimento fetal crônico.

Por um outro lado, a placenta pode ser incapaz de transportar a quantidade necessária de oxigênio, assim com nutrientes. Nessa situação, mesmo que o fluxo sanguíneo para o útero seja adequado, a placenta não consegue transportar esse fluxo para o bebê. Como consequência nestes casos ele também recebe uma quantidade reduzida de oxigênio e nutrientes.

Como muitas vezes não é possível identificar se o problema está no aporte sanguíneo para o útero ou na capacidade da placenta de transferir oxigênio e nutrientes para o bebê, muitas vezes optamos por chamar este quadro de insuficiência útero-placentária.

Quais são os sinais de sofrimento fetal?

Em primeiro lugar é importante frisar que quando estamos diante de um diagnóstico médico de de sofrimento fetal isso não significa que o bebê está sentindo dor, seja ela física ou emocional. A gestante não percebe nenhum sintoma diferente. Entretanto alguns sinais podem ser observados por seu médico ou até mesmo pela futura mamãe e familiares.

  • Redução da movimentação fetal: um dos principais sinais de boa vitalidade do bebê é a sua movimentação. Em casos onde existe uma insuficiência útero-placentária uma situação que pode ser observada é a redução na quantidade de movimentos fetais durante o dia. Mas atenção, é importante que você converse com seu médico a respeito da movimentação fetal pois existem épocas onde o bebê pode mexer mais ou menos. Nem toda redução de movimentação significa um problema. Para maiores informações sobre como funcionam os movimentos fetais durante a gestação leia nosso post sobre esse assunto.
  • A altura uterina está abaixo do esperado: lembra que o médico mede o tamanho da sua barriga nas consultas de pré-natal? Pois bem, essa medida é uma maneira indireta do seu médico avaliar o crescimento fetal durante a gestação. Caso a altura uterina esteja incompatível com a idade gestacional isso pode indicar um comprometimento do crescimento fetal. Nestes casos o seu médico poderá pedir para que você faça um exame de ultrassonografia para avaliar como está o peso fetal estimado.

Alterações observadas no ultrassom

A mãe ou o médico podem não perceber diretamente algumas alterações que podem estar associadas ao sofrimento fetal. Elas apenas podem ser vistas no ultrassom.

  • Peso fetal estimado abaixo do esperado: durante os exames de ultrassom que você faz na gestação o médico irá estimar o peso do bebê. Caso o peso do bebê esteja abaixo do esperado, isso pode ser um sinal de que a placenta não está funcionando como deveria. Entretanto se o peso do seu bebê não está adequado, antes de ficar preocupada converse com seu médico, pois nem todo bebê pequeno é um problema.
  • O volume de líquido amniótico está abaixo do esperado: uma das alterações que podem ser encontradas em casos de sofrimento fetal por insuficiência útero-placentária é o volume de líquido amniótico. Sabemos que o líquido amniótico é produzido, na sua maioria, pela urina do bebê. Em situações onde o bebê recebe poucos nutrientes e oxigênio, ele lança mão de um mecanismo de defesa chamado “centralização fetal”. A centralização nada mais é do que desviar o fluxo sanguíneo para áreas mais “nobres” do corpo, como o sistema nervoso central, em detrimento de outras regiões, como por exemplo os rins. Quando esse desvio ocorre, protege-se o cérebro, porém a produção de urina diminui consideravelmente, resultando na redução do volume de líquido amniótico.

Qual a diferença entre sofrimento fetal agudo e sofrimento fetal crônico?

De uma maneira geral chamamos de sofrimento fetal agudo aquele que acontece subitamente durante o trabalho de parto. Já o sofrimento fetal crônico é aquele que acontece durante a gestação, antes mesmo do trabalho de parto ter iniciado.

Essa distinção é importante pois muitas vezes a função da circulação útero-placentária durante a gestação é adequada, porém muito próxima do mínimo necessário. Durante o trabalho de parto as contrações uterinas provocam uma redução no fluxo sanguíneo da mãe para o feto. Lembre-se de que o útero é um músculo e, quando ele contrai, também comprime os vasos sanguíneos que atravessam a parede do útero, reduzindo consideravelmente a quantidade de sangue transportada.

Não acredita? Feche a sua mão com força por alguns segundos e depois abra ela. Observe como quando você abriu ela estava pálida e após abrir a mão ela foi progressivamente se tornando vermelha. Pois bem, é bem isso que ocorre durante uma contração uterina.

Como identificar o sofrimento fetal?

Caso exista algum indício de sofrimento fetal durante a sua gestação, possivelmente o seu obstetra poderá solicitar um dos seguintes exames:

  • Doppler obstétrico (ou Dopplerfluxometria): este exame de ultrassom com Doppler serve para avaliar os fluxos sanguíneos para o bebê. Os vasos habitualmente estudados são as artérias uterinas, a artéria umbilical (um dos vasos do cordão umbilical) e a artéria cerebral média (um vaso do cérebro do bebê.
  • Perfil Biofísico Fetal (ou PBF): este também é um exame de ultrassom, entretanto ao invés de analisar fluxos sanguíneos o médico irá observar algumas características biofísicas do bebê, como a presença de movimentos fetais, movimentos respiratórios, o tônus muscular do feto e a quantidade de líquido amniótico. A análise destes parâmetros permite identificar como está a saúde do seu bebê.
  • Cardiotocografia (ou CTG): neste exame será feito o registro da frequência cardíaca fetal por cerca de 10 a 20 minutos. A análise do padrão de frequência cardíaca do bebê também permite ao obstetra ter uma idéia de como está a saúde do seu bebê e se existe algum sinal de sofrimento mais grave.

O que a falta de oxigênio pode causar para o feto?

Na maioria das vezes que temos sofrimento fetal ele ocorre de uma maneira bastante branda e no fim da gestação. Na maioria das vezes o quadro não será grave e haverá reversão do mesmo ao nascimento.

Portanto, se o seu bebê está com o peso um pouco baixo em função de uma insuficiência útero-placentária leve ao nascer esse fator limitante será removido. Após o nascimento do bebê a possibilidade de uma vida normal é muito grande.

Entretanto existem casos de sofrimento fetal muito grave e que iniciam de maneira bastante precoce. Nestas situações podem ocorrer situações de hipóxia grave (falta de oxigênio) que poderão provocar o que chamamos de acidose metabólica. A acidose metabólica nada mais é do que o efeito produzido pela falta de troca de gases na placenta. A concentração de gás carbônico aumenta deixando o sangue mais ácido.

Em situações bastante incomuns poderá ocorrer uma diminuição tão severa de oxigênio que irá provocar uma lesão cerebral. Felizmente esta situação é bastante rara. Ela geralmente está associada com as restrições de crescimento fetal que são diagnosticadas muito precocemente, ainda no segundo trimestre da gestação.

Como podemos tratar o sofrimento fetal?

Quando temos o diagnóstico de sofrimento fetal infelizmente não há um tratamento específico. Em situações mais extremas pode ser necessário a antecipação do parto para que o recém-nascido possa receber a quantidade adequada de oxigênio e nutrientes.

A ausência do fator limitante para a nutrição e oxigenação do bebê irá permitir que ele se desenvolva de maneira adequada, possivelmente atingindo um peso normal na sua vida adulta.

Cordão umbilical no pescoço pode causar sofrimento fetal?

Apesar de ser uma crença comum que o cordão em volta do pescoço possa trazer algum prejuízo para o feto, na prática isso não é verdade. É relativamente comum que o cordão umbilical, quando bastante longo, esteja próximo ou até mesmo enrolado no pescoço do feto.

Entretanto isso não é um problema pois como o cordão é naturalmente longo ele não é apertado, nem mesmo durante o trabalho de parto. Portanto, apesar de existirem diversos motivos para o sofrimento fetal, ter o cordão enrolado no pescoço não é um deles.

Como identificar o sofrimento fetal durante o trabalho de parto?

Em algumas situações o trabalho de parto é um momento crítico para o surgimento do sofrimento fetal. Lembre-se que durante o trabalho de parto ocorre uma situação singular que é a presença das contrações uterinas com maior frequência e intensidade.

Ao ocorrem contrações uterinas, o fluxo de sangue da mãe para o útero é reduzido, o que pode causar o surgimento de sofrimento fetal que antes não era possível de ser diagnosticado. É como se o trabalho de parto fosse uma teste de estresse para a vitalidade do bebê e todo o sistema que leva oxigênio e nutrientes para ele.

Portanto, durante o trabalho de parto, precisamos realizar avaliações para garantir que tudo está ocorrendo como esperado. Identificar problemas rapidamente neste momento permite a tomada de medidas para preservar a saúde fetal.

Dessa forma dispomos de duas maneiras de controlar a vitalidade do bebê durante o trabalho de parto. A primeira delas, e a mais utilizada, é a ausculta intermitente dos batimentos cardíacos do bebê. Por isso o seu obstetra irá de tempos em tempos auscultar a frequência cardíaca fetal. A identificação de padrões alterados deverá dar um sinal de alerta de que algo não está como deveria.

A segunda maneira de controlar a vitalidade fetal durante o trabalho de parto é por meio da utilização de um sistema de cardiotocografia contínua, chamada cardiotocografia intra-parto.

Por que usamos o termo sofrimento fetal?

A tradução livre de “fetal distress” é “sofrimento fetal”, um termo que se usa na língua inglesa. Apesar de distress ter como principal tradução para o português sofrimento, neste caso a tradução mais adequada seria perigo ou dificuldade. Neste caso, seria um perigo de uma lesão pela falta de oxigênio comprometendo o bem estar fetal. Sendo esse perigo causado pela dificuldade em receber oxigênio, ou pela insuficiência placentária ou pela vascularização uterina não adequada.

Categorias: Dúvidas, Gestantes
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